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Música: quais os benefícios para o paciente com Alzheimer?

08 de Janeiro de 2017
TENA

Um trailer no YouTube mostra um idoso demenciado em uma instituição de longa permanência sentado, quieto, introspectivo, sem qualquer interação com outros institucionalizados ou funcionários do local. No entanto, assim que colocam em seus ouvidos um fone ligado a um dispositivo de música (iPod) tocando músicas de sua juventude, ele desperta. Seus olhos se abrem, ele começa a cantar e a movimentar as mãos. O impacto do trailer foi imenso: em poucos meses, mais de 10 milhões assistiram o trailer do documentário Alive Inside – a story of music and memory, disponível no Netflix, serviço de transmissão de filmes via streaming.

O documentário mostra como a música consegue resgatar não apenas as memórias, mas a vida de idosos com demências que já não se comunicavam e não se lembravam mais do passado, da juventude, de suas dores e pessoas que amaram. Isso porque, conforme o idealizador do projeto Dan Cohen diz no filme, “a música pode ligar as pessoas com o que elas foram, quem elas são e suas vidas”. Cohen é um ativista do uso da música personalizada, ou seja, escolhida de acordo com a história de cada pessoa, como um meio para resgatar as lembranças desses idosos com demência de Alzheimer ou outras, muitos abandonados em instituições para idosos nos Estados Unidos.

O neurocientista inglês Oliver Sacks (falecido em 2015) participa do filme, trazendo algumas contribuições para explicar o poder da música nos pacientes. “A música é inseparável da emoção, portanto não é apenas um estímulo fisiológico, ela traz emoção e também informação”, diz. Por isso os idosos conseguem lembrar de fatos que aconteceram na época em que escutavam aquelas canções no passado.Esse tipo de uso da música já vem sendo reconhecido em diversos locais do mundo e também no Brasil. “Em princípio, os pacientes com Alzheimer não conseguem acessar a memória mais imediata e a perda vai progredindo. Estudos já têm mostrado que a música consegue resgatar a memória antiga, que está sedimentada”, explica o geriatra Paulo Renato Canineu, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Desta maneira, ao ouvir uma canção que está ligada a alguma época ou fato da vida, a pessoa consegue trazer de volta essa lembrança.

O geriatra testemunhou uma experiência desse tipo durante a atuação dos Músicos do Elo, um grupo de músicos profissionais especializados em tocar em hospitais. O psicólogo Thiago dos Reis Hoffmann estudou a atuação desse grupo em um centro de hemodiálise em seu mestrado em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Hoffmann não acreditava que houvesse qualquer efetividade entre a música e a qualidade de vida, bem-estar dos pacientes e melhora nos sintomas depressivos e estava disposto a provar isso por meio de sua pesquisa. No entanto, os resultados obtidos mostraram que ele estava errado. No Centro de Diálise e Transplante Renal do Hospital Santa Lucinda, o psicólogo analisou dois grupos de 50 pacientes renais crônicos, entre eles alguns com demência. Um dos grupos recebeu, durante uma hora por semana, a visita dos Músicos do Elo, tocando durante a hemodiálise. Outro grupo, o chamado controle, não teve acesso à música.

No início, no meio e no final do período de estudos de Hoffmann, foram aplicados questionários e instrumentos para medir o grau de depressão e os índices de qualidade vida, segundo a Organização Mundial da Saúde, nos pacientes. “Foi notória a diferença positiva no grupo dos pacientes submetidos à música”, conta ele, que se surpreendeu com os resultados da pesquisa.

Além dos pacientes – que passam a ter a diálise como rotina de suas vidas – os cuidadores, familiares e a equipe de saúde também faziam parte da sessão de música. “Alguns pegavam instrumentos, outros, madeira, caixinha de fósforo, o que tivessem à mão para acompanhar os músicos”, diz.Com a música, muitos dos idosos com demência começavam a cantarolar e a interagir. Hoffmann explica. “O idoso com demência não lembra nada recente, então ele vive como se estivesse numa festa em que não conhece ninguém – e acaba por se isolar”, diz. “Quando toca uma música que ele gosta, que aciona uma memória nele, ele comece a cantarolar e se sente parte da festa, da vida novamente”.

Quanto melhor for a qualidade da música e mais significado ela tiver no contexto de vida daquele idoso, melhores os resultados obtidos no “resgate” desse paciente. No entanto, não é preciso ser músico profissional para conseguir algum tipo de resultado junto a idosos com Alzheimer ou outros tipos de demência. “Um familiar ou um cuidador pode cantar para o idoso, colocar música. Pode pedir orientação para alguém da equipe de saúde, o fonoaudiólogo, terapeutas ocupacionais, para que a ação seja mais efetiva. Certamente fará bem à pessoa com demência”, afirma Canineu.

O médico acredita que um tratamento mais efetivo para o Alzheimer está prestes a ser alcançado pela Ciência. “Creio que não será algo simples como um comprimido, mas algo na terapia não farmacológica, envolvendo atividade física, cognitiva, nutricional e outros”, diz. “A música certamente contribui para isso”. Assim como a música, especialistas que atuam com pacientes com demência incentivam que o cérebro seja desafiado constantemente como forma de manter a cognição em dia. Fazer sempre atividades diferentes, tocar um instrumento novo, aprender um idioma, ler e praticar exercícios são algumas boas práticas.

Quando o Alzheimer já foi diagnosticado, além dessas atitudes, outras ações também podem ajudar o idoso em seu dia a dia. Manter uma rotina com os horários de refeições, banho, horário de dormir e acordar, bem como outras atividades, permite que o idoso se sinta mais seguro e tenha fome e sono nos horários adequados. Deixe também a casa arrumada para que as coisas sejam encontradas com facilidade e estimule o idoso a conversar. Para saber mais sobre memória e como preservá-la, acesse: http://www.tena.com.br/cuidadores/perda-de-memoria-x-doenca-de-alzheimer-como-diferenciar-e-o-que-fazer-em-cada-caso/